segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Jovem hacker chinês mostra como atua

 PERFIL Repórter visita casa de ciberpirata, que apresenta lista de suas vítimas e demonstra como invade o site de uma empresa

DAVID BARBOZA
DO "NEW YORK TIMES"

Com alguns toques rápidos no teclado, um hacker que atende pelo codinome Majia abre uma tela que mostra suas vítimas mais recentes.
"Essa é uma lista de pessoas infectadas com o meu cavalo-de-troia", diz, operando em um apartamento malconservado na periferia de Changsha, no centro da China. "Eles nem sequer sabem o que aconteceu." Uma armadilha on-line criada por ele já enganou, na China e em outros países, 2.000 pessoas -que, ao clicarem em algo que não deveriam, acabaram espalhando inadvertidamente um vírus que permite ao hacker assumir o controle de seus computadores e roubar senhas de contas bancárias.
Majia, um jovem de fala mansa, recém-formado na universidade e com pouco mais de 20 anos, é um ladrão cibernético. Ele age secreta e ilegalmente e faz parte de uma comunidade de hackers que explora falhas de software para invadir sites, roubar e vender dados valiosos.

Ação política
Especialistas em segurança de internet dizem que a China possui uma legião de hackers iguais a Majia. Além de criminosos independentes, há os chamados hackers patrióticos, que concentram seus ataques em alvos políticos.
Com a condição de não ser identificado, Majia recebeu a reportagem para falar de sua atuação. De aparência esbelta e elegantemente vestido com roupas pretas, ele estava disposto a contar a sua história. Como muitos hackers, ele espera ser reconhecido por suas habilidades, mesmo que para isso tenha que prezar pelo seu anonimato para não ser detido.
O jornal "New York Times" chegou até ele por meio de outro hacker bem conhecido, que faz parte de um grupo de hackers e que garantiu que Majia é bom no seu trabalho. Embora as afirmações de Majia, claro, não possam ser verificadas, ele está feliz por demonstrar suas habilidades. Convidou o repórter para ir à sua casa, onde mostrou como invadia o site de uma empresa chinesa. Quando o site apareceu em sua tela, ele criou páginas adicionais e digitou a palavra "invadida" em uma delas.
Majia disse ter se apaixonado por hacking durante o primeiro ano de universidade, depois que seus amigos lhe mostraram como atacar um sistema.
Depois de obter um diploma em engenharia, ele aceitou um emprego em uma agência do governo, algo que fez em grande parte para agradar os seus pais. Mas, todas as noites depois do trabalho, ele se volta para sua paixão: hacking. Consumido pelos desafios ligados a essa atividade, ele lê revistas voltadas para hackers, troca informações com um pequeno círculo de hackers e escreve códigos maliciosos. Também usa cavalos-de-troia para se infiltrar em computadores de outras pessoas, infectá-los e, assim, ser capaz de assumir o controle deles.
"A maioria dos hackers é preguiçosa", disse Majia, sentado na frente do computador em seu modesto quarto com vista para um dilapidado complexo de apartamentos. "Somente alguns de nós conseguem realmente escrever códigos, pois é essa a parte difícil."

Atrás do dinheiro
A atividade é ilegal na China. No ano passado, Pequim reviu e endureceu uma lei que torna crime a ação de hackers, sujeito a punições de até sete anos de prisão. Contudo Majia parece não se preocupar, especialmente porque a lei em grande parte não é aplicada com rigor.
Mesmo assim, toma cuidado. Ele reconhece que, em parte, o que o atrai é o dinheiro. Vários hackers ganham muito, disse. E ele parece estar traçando o seu próprio caminho. Exatamente quanto ganhou até agora, ele não diz. Mas admite que vende códigos maliciosos para outros; e alardeia que é capaz de entrar em contas bancárias de terceiros enquanto opera micros à distância. O incentivo financeiro é o que motiva muitos hackers chineses como Majia.
Um desses piratas invadiu o site do governo norte-americano e realizou, posteriormente, uma palestra sobre o tema em uma universidade. Esse hacker também trabalhou para o ministro da Segurança da China. Mas muitos tentam lucrar com dados roubados de grandes corporações ou ensinando como invadir computadores.
"Eles ganham muito vendendo vírus e cavalos-de-troia para corromper computadores de outras pessoas", afirmou Scott Henderson, autor do livro "The Dark Visitor: Inside the World of Chinese Hackers" (O Visitante Secreto: Por Dentro do Mundo dos Hackers Chineses, na tradução livre). "Também invadem contas de jogos on-line e vendem os personagens virtuais. É muito dinheiro." Majia mora com os pais, e, no seu quarto, tem pouca coisa além de um computador de mesa, uma conexão de internet de alta velocidade e um armário.
Não há pintura especial nem qualquer tipo de decoração. Sua socialização ocorre principalmente on-line, onde ele trabalha a partir de aproximadamente 18h30 até 0h30. Indagado sobre o motivo pelo qual ele não trabalha para uma grande empresa de tecnologia chinesa, ele olha com desdém e diz que isso limitaria a sua liberdade.

Tradução de FABIANO FLEURY DE SOUZA CAMPOS

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